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Palestra da Escola do MP discute cadeia de custódia da prova
No último dia 6 de agosto (quinta-feira), alunos da Escola do Ministério Público, Promotores de Justiça do MPSC e de outros estados, Peritos Criminais e profissionais de diversas carreiras jurídicas assistiram a palestra online “Cadeia de custódia”. O evento contou com a participação do Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) Rogério Sanches Cunha, do Perito-Geral adjunto do Instituto Geral de Perícias (IGP) Júlio Freiberger Fernandes e da Promotora de Justiça do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) Simone Sibilio.
A palestra foi realizada pela Escola do MP em parceria com a ACMP e reuniu, por meio da plataforma Zoom, membros associados que interagiram diretamente com os palestrantes. A transmissão aberta foi realizada simultaneamente no canal da Escola do MP no YouTube.
Rogério Sanches deu início à primeira parte do evento com uma abordagem jurídica do tema. O Promotor de Justiça é também professor de Direito Penal e um dos poucos autores de publicações sobre a Lei 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime. A cadeia de custódia da prova foi introduzida com um capítulo exclusivo no Código de Processo Penal (CPP) por essa lei e implementou significativas atualizações sobre o assunto. Segundo o artigo 158-A, a cadeia é um conjunto de procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica de vestígios coletados em locais ou vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte. O objetivo é garantir a autenticidade da matéria coletada e diminuir ao máximo a possibilidade de contaminação. Dessa forma, busca-se assegurar a identificação, a origem e a essência do que está sendo coletado e armazenado.
A cadeia de custódia é utilizada também para certificar a autenticidade de pedras preciosas, madeira e exames de sangue, por exemplo. Quanto mais preservados forem os procedimentos da cadeia, maior será o valor do material. O CPP já apresentava dispositivos que buscavam preservar do local do crime, como os artigos 6º e 166. Porém a atualização proporcionou maior rigorosidade na cadeia. O debate gerado em torno dessas alterações envolve as consequências de uma falha ou não obediência das etapas da cadeia de custódia: A prova será considerada ilegal ou deixa de ser autêntica? É possível escalonar a autenticidade em graus? O juiz poderá rejeitar a prova ou atribuir um valor mitigado?
Ao tentar solucionar esses questionamentos, Sanches apresenta uma análise da prova em três dimensões: existência, legalidade e autenticidade. Para o Promotor de Justiça a não observância de alguma etapa da cadeia não interfere na existência da prova, nem em sua legalidade, mas gera reflexos na sua autenticidade. Deve-se analisar qual o grau de descumprimento da cadeia e, a partir disso, considerar a prova mais ou menos autêntica. Nesses casos caberá ao juiz aferir maior ou menor valor probatório à prova de acordo com o prejuízo causado.
Rogério Sanches chama atenção ainda para os desafios enfrentados pelos institutos de perícia de São Paulo, e de todo o país, para realizar as adequações estipuladas no CPP em um curto período, considerando a complexidade das alterações. Dessa forma, o professor defende que a prova passe por processos que causem a mínima mutação ou contaminação até que os órgãos tenham estrutura adequada para cumprir a cadeia com toda a rigorosidade necessária.
A Promotora de Justiça e coordenadora do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) Simone Sibilio complementou a fala de Rogério Sanches com práticas implementadas no MP do Rio de Janeiro. Desde fevereiro de 2020, o Gaeco adotou um protocolo de atuação em relação à cadeia de custódia. O processo engloba a coleta, acondicionamento, transporte, recebimento e armazenamento dos materiais.
Simone Sibilio explica que o MPRJ realizou uma compra emergencial de invólucros com lacre para atender as demandas de segurança da coleta e a partir de então a preocupação foi com o destino dos materiais coletados. O protocolo apresentado estabelece a seguinte dinâmica: após a coleta o material segue para o órgão de perícia oficial. Ao adentrar o órgão, é realizada uma solicitação para que um auxiliar técnico do Ministério Público esteja presente no ato da abertura do malote lacrado. Há também a solicitação de um exame técnico pericial descritivo de todos os materiais coletados que vai certificar a origem dos objetos.
Em alguns casos, nos quais há apreensão de celulares e computadores, pode haver a fase de extração de conteúdo dos dispositivos. Caso o órgão de perícia não tenha capacidade física e tecnológica para realizar tal atividade, o responsável por essa etapa será o Ministério Público — utilizando-se do assistente técnico com a presença do perito oficial. Depois disso, todo o material coletado e analisado será encaminhado para a central de custódia. Os profissionais que entraram em contato com a matéria assinam um termo para assegurar o envolvimento dos agentes. A Promotora diz que é um procedimento simples, mas que confere mais segurança à autenticidade da prova coletada e previne eventuais objeções sobre a cadeia de custódia.
Na segunda parte da palestra, o Perito-Geral Júlio Freiberger apresentou questões técnicas, curiosidades e dados sobre a atuação do IGP em Santa Catarina. O órgão conta com uma série de doutrinas internas e um manual para garantir a menor contaminação possível da prova. Para o Perito, o cumprimento dos procedimentos da cadeia consiste em uma tarefa descomplicada. “Uma vez que a prova não trabalha para a acusação ou para a defesa, ela traz a imparcialidade”, completa. Mas Júlio Freiberger frisa que a realidade de cena de um crime não é a ideal, pois é bastante difícil isolar o caso dos curiosos, familiares, da mídia e de outras pessoas não autorizadas.
A cadeia de custódia trata do tempo: história cronológica do vestígio; da pessoa: posse e manuseio; da amostra: integridade do vestígio; e dos documentos: rastreabilidade e registro, ou seja, inclui todos os agentes envolvidos no processo. Ela é divida em duas fases da operação: interna e externa. A fase externa trata da parte de procedimento de trabalho e envolve análise, extração de dados e de informações e formação da prova. No entanto, a fase externa é tão importante quanto, pois nela está envolvida o primeiro agente que toma conhecimento ou que produz a prova. Por isso, Júlio defende a necessidade de que a custódia trabalhe com procedimentos policiais, periciais e com um agente do Ministério Público, visto que há produção de provas no âmbito do MP.
O Perito-Geral finalizou sua participação ao falar sobre o avanço tecnológico e o crescente número de provas criminais obtidas em meio digital: computadores, telefones, HDs etc. Em 2019, foram realizadas mais de 5 mil solicitações de exames na área da informática forense. No mesmo período, foram pouco menos de 2 mil solicitações para análise de vestígios biológicos. Os dados são do estado de Santa Catarina e consideram números totais. Nesse cenário, Freiberger tem a expectativa de que a cadeia de custódia passe a ser mais questionada no âmbito cibernético.
Após a fala do Perito Júlio Freiberger, os participantes puderam fazer questionamentos aos palestrantes e ainda participaram de um quiz que presenteou o ganhador com a obra “Pacote Anticrime - Lei 13.964/2019: Comentários às alterações no CP, CPP E LEP”, de autoria do convidado Rogério Sanches. A transmissão reuniu cerca de 150 espectadores no YouTube e gerou um importante debate entre profissionais e estudantes.
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